Cid Gomes faz teatro no picadeiro do PDT

É puro mise-en-scène a última movimentação de Cid Gomes e sua trupe no palco das armações partidárias. Embora no exercício da liderança do partido no Senado, o ex-governador do Ceará cumpre o roteiro e se faz de vítima, ao dizer que “não nos querem no partido e até nos humilham”. Difícil de acreditar para quem acompanha os bastidores da política, mas a performance do ex-prefeito de Sobral se destina a plateias.

No script de Cid, há uma fala sobre a democracia, que o direito da maioria não estaria sendo respeitado. Cid Gomes não tem o physique du rôle para desempenhar esse papel. Melhor seria ter colocado essa fala para outro personagem. Mas, quem está acostumado com os holofotes da ribalta, não se contenta com o proscênio. Chama para si todo o protagonismo.

Cid Gomes não foi nada democrático quando não aceitou – apenas aquiesceu – a decisão da maioria do diretório estadual do partido que optou pela candidatura de Roberto Cláudio ao governo do Estado, preterindo a preferida de Cid, a então governadora Izolda Cela. Desolada, Izolda apeou do partido, que já não lhe servia de cavalo para encaminhar sua candidatura à reeleição.

Na refrega eleitoral, Cid Gomes, o guerreiro vitorioso de todas as batalhas, deixa a luta e se exila na Palestina, localidade da serra da Meruoca, onde Ferreira Gomes tem um bucólico sítio. Fez beicinho porque sua vontade imperial foi afrontada pela primeira vez e foi lamber as feridas no balanço da rede no frio serrano. Local de refrigério, já foi palco de brigas domésticas, mas jamais na dimensão do que agora ocorrera, no confronto com o velho mano.

Assim como o xará, príncipe de Valência, El Cid, que brigou com irmãos, nosso príncipe do Norte, alçado ao palco político pelo irmão, que já fora prefeito de Fortaleza e governador do Ceará, e virou estrela nacional, revoltou-se contra seu padrinho, que queria sobrepor os temas federais aos interesses paroquiais. Na visão de Ciro, seria uma vitória de Pirro, a reeleição de Izolda. Achou preferível perder com RC a ganhar com IC.

Segundo Ciro, Izolda Cela, esposa do Veveu, ambos cevados politicamente pelos Ferreira Gomes, estava mais camiliana que cidista. Tentou abrir os olhos do irmão. O que, aliás, já tinha feito quando sabotou o acordo para candidatura de Eunício ao Senado, que seria reconduzido à presidência do Congresso. Era muita luz a ofuscá-lo. Num cenário de eleição de Camilo, com uma carreta de votos, aliado ao presidente do Senado, o poder dos Ferreira Gomes seria inexoravelmente mitigado. A essa compreensão, deve-se a eleição de Eduardo Girão.

Cid tinha um sonho. A quimera, quem dera, era ter o segundo turno com um dos candidatos enfrentando Capitão Wagner. O sonho de Ícaro subiu a serra, mas se espatifou com a solar vitória de Elmano logo no primeiro turno. Cid, que achava que voltaria ao palco como o grande conciliador das forças para derrotar o inimigo comum, teve que se reposicionar, pois o inimigo principal tem o mesmo sangue seu.

Desde então, Cid Gomes tenta se reposicionar, pois já não detém o poder de outrora (senão, teria imposto sua candidata) e se manter na esfera do poder, na espera do reconhecimento de seu afiliado Camilo Santana, a estrela de maior grandeza da atual política cearense, à frente do Ministério da Educação, garantindo a cadeira do Senado para uma aliada sua, e com Elmano na algibeira.

Ainda sob os ecos da frase “O Lula está preso, babaca“, proferida em raro momento de exasperação de Cid, uma ala petista não tem a menor comiseração com os infortúnios da família FG. Mas, com a força remanescente, Cid, com uma procissão de vereadores, prefeitos e deputados, esperneia para fazer valer seu valor nas próximas eleições municipais, cuja coroa mais desejada, por óbvio, é Fortaleza, governada pelo pedetista Sarto Nogueira.

Como Cid, de novo, não veria prevalecer sua candidatura, articulou uma sublevação contra a executiva do PDT. Fez um acordo para assumir a presidência do diretório, com o intuito de apaziguar a sigla e evitar a debandada. Como primeiro ato, foi a carta de anuência para o deputado Evandro Leitão sair do partido sem risco de perder o mandato. Ora, era um ato contra o partido, pois dava à outra agremiação um nome forte na concorrência contra o candidato do PDT.

A executiva nacional percebeu o golpe que se desenhava e correu a se antecipar, para evitar a saída “aos borbotões“, com a porteira aberta por Cid. A partir daí, manobras de parte a parte, com a judicialização das demandas. Quando, numa nesga temporal, Cid reassume o poder, cai o pano, deixando clara sua missão. Deu carta de anuência a granel. A partir daí, tendo uma reunião com deprimente troca de acusações pelo meio, o PDT intervém no Ceará, e ameaça com expulsão quem usar a carta de anuência.

Com um texto bem ensaiado, Cid e os demais figurantes da ópera falam em perseguição, em humilhação, querendo, com isso, criar um fato político/jurídico para alegar justa causa a fim de deixar o partido sem as punições previstas em lei sobre a infidelidade partidária.

Tal qual o parasita, Cid Gomes usa e abusa dos partidos (o PDT é o sexto). Ao entrar na agremiação com seu grupo, costuma desbancar os membros históricos e usa a agremiação a seu bel prazer. Até o momento em que é contrariado, como ocorre agora, mais uma vez, desta feita no PDT, contra o qual arremete sua tropa, ameaçando deixar só o bagaço.

Tudo nesse momento não passa de encenação, o senador é um ator razoável, mas há muitos canastrões nesta ópera, cujo resumo é a busca do poder pelo poder a qualquer custa. Mesmo com fratricídios.


Assista ao comentário, um recorte do Café com Cléver, programa veiculado nas rádios:
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Luciano Cléver

Luciano Cléver

Jornalista formado pela UFC, em 1988, coordenou o núcleo de comunicação da Caixa por 18 anos, trabalhou como repórter na Gazeta Mercantil, no Diário do Nordeste como secretário de redação, editor do jornal Expresso do Norte (Sobral), foi editor do portal do Sistema Paraíso. Está à frente do programa de rádio Café com Cléver, veiculado na rádio Paraíso FM (Sobral). E nas redes sociais (Youtube.com/@cafecomclever). É comentarista na TV União. Cristão, apaixonado por cinema, vinho e xadrez.

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