Artigo – Itamaraty ignora abutres e honra sua tradição

A missão de um governo com valores republicanos transcende à legítima busca pela aprovação dos eleitores. Às vezes é importante relativizar a preocupação de curto prazo com a conquista de índices expressivos de ótimo e bom nas pesquisas em nome de princípios e convicções humanistas e democráticas.

A posição do governo do Brasil no conflito do Oriente Médio, expressa através do Itamaraty e das falas e postagens do presidente Lula, é um exemplo da necessidade de se assumir posições eventualmente contramajoritárias, para reafirmar compromissos com os direitos humanos, a autodeterminação dos povos e seus direitos a um estado livre e soberano.

Governos do campo progressista que se prezem não podem se deixar pautar o tempo inteiro pelas pesquisas e pelas próximas eleições. Disputar espaços nos corações mentes e contribuir para o avanço da consciência política e cidadã das sociedades são objetivos que devem ser perenes.

Algumas ações do governo Lula na guerra de Israel contra o povo palestino e as reações da imprensa comercial e das redes sociais são exemplos de como o certo a fazer em algumas ocasiões é remar contra a maré:

1) Desde o dia da investida do Hamas contra Israel, Lula e a diplomacia brasileira vêm condenando o terrorismo contra civis praticado pelo Hamas, mas defendendo a posição histórica do Brasil sobre a questão palestina: a convivência entre dois Estados, um judeu e um palestino, com fronteiras seguras e reconhecidas internacionalmente.

Mas logo entra em campo a mídia pró-Israel do Brasil e do exterior apontando o dedo para a nossa diplomacia por não definir explicitamente o Hamas como um um grupo terrorista. Como se isso coubesse ao governo, e não ao Conselho de Segurança da ONU.

2) O Brasil monta o mais bem-sucedido resgate de nacionais que sem tem notícia na história, feito reconhecido no mundo todo. Quase mil brasileiros que viviam em Israel já estão seguros em nosso país. Agora, o Itamaraty negocia incessantemente com o Egito e com Israel, para que liberem a passagem da fronteira, possibilitando que um avião da FAB possa tirar de Gaza 28 brasileiros.

No entanto, o foco principal de boa parte da mídia é entrevistar os brasileiros recém-chegados, como se a ação que os trouxe de volta fosse obra e graça do espírito santo. Já o portal UOL prefere destacar uma pesquisa de uma empresa de monitoramento das redes sociais dando conta de que as postagens que refletem a visão dos bolsonaristas sobre a guerra são ampla maioria.

3) Os diplomatas brasileiros levam à ONU o debate urgente sobre um cessar–fogo, aproveitando o fato de o Brasil ocupar no momento a presidência rotativa do Conselho de Segurança. O acordo é dificílimo, pois os membros permanentes do conselho têm poder de veto. Só para se ter uma ideia de como as coisas funcionam na ONU, em 50 anos, os EUA já vetaram 50 denuncias contra Israel no conselho.

Mas proposta do Brasil segue sendo tratada com desdém pela mídia hegemônica.

4) Com o avanço do genocídio contra a população palestina de Gaza e Israel praticando crimes de guerra em série, tal como impedir a entrada de água, comida, medicamento, combustível e eletricidade, Lula propõe junto à ONU a criação de corredores humanitários no território. Antes, Lula propusera a libertação imediata de todas as crianças feitas reféns pelo Hamas.

Contudo, os holofotes das emissoras de TV, no que se refere às negociações, passam a priorizar a ida a Israel e a quatro países árabes do secretário de estado norte-americano, Antony Blinken. Só que Blinken não defende a paz coisa nenhuma em suas conversações. Apenas reforça o apoio incondicional dos EUA ao governo racista de Israel e trata o massacre dos palestinos como “direito de Israel à defesa.” Por isso, foi mal recebido pelos árabes.

Moral da história: o Itamaraty honra sua longa tradição em defesa da liberdade, da paz e da soberania das nações. Mas, se a maioria das pessoas, intoxicadas pela cobertura manipuladora da imprensa ocidental e pelas fake news da extrema-direita, não reconhecem o esforço pela paz e as ações humanitárias da diplomacia do Brasil, paciência. Azar o delas.

Sobre o título deste artigo, é importante assinalar que abutres são animais de hábitos necrófagos, ou seja, se alimentam de animais mortos.

Bepe Damasco é jornalista e editor do Blog do Bepe

Nicolau Araújo

Nicolau Araújo

Nicolau Araújo é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará, especialista em Marketing Político e com passagens pelo O POVO, DN e O Globo, além de assessorias no Senado, Governo do Estado, Prefeitura de Fortaleza, coordenador na Prefeitura de Maracanaú, coordenador na Câmara Municipal de Fortaleza e consultorias parlamentares. Também acumula títulos no xadrez estudantil, universitário e estadual de Rápido.

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